terça-feira, 29 de junho de 2010

A FUGA E O ESCONDEDOURO: Fases e Facetas de Julietta Damasceno

       Parte I (o sonho/pesadelo!?!)

       Eles estão vindo em minha direção, desgovernados com olhos grandes e esbugalhados. O desespero e o medo lhes acertaram em cheio, as olheiras acopladas em seus rostos pálidos, estão presentes...fortemente perceptíveis.
       Uns caindo sobre os outros, sem respeito, sem cavalheirismo perante as moças que também corriam para cá com seus lindos vestidos pisoteados e rasgados, seus penteados desfeitos e ridicularizados pelos puxões dos outros que corriam logo atrás das mesmas.
       Suas maquiagens borradas, o lápis preto que contornavam em seus olhos para realçá-los, estavam agora escorrendo sobre suas faces ensopadas de lágrimas salgadas, tornando então um líquido preto que passeavam sobre seus rostos pálidos e indefesos.
       Os batons avermelhados sobre seus lábios, eram inertes frente a tantos gritos e xingamentos. A beleza a qual foi calculadamente planejada em suas casas, em seus quartos frente ao espelho, aos poucos se tornou ausente e a beleza do medo e do pavor logo se ascendeu, a sensualidade feminina que o pânico desperta, torna-se interessante quando se analisa a estratégia de salvação. De sair do perigo sem desfazer seus penteados e tampouco borrar suas maquiagens, livrando-se também de quebrar suas unhas fielmente cultivadas, ou arranhar o salto de seus sapatos, os quais foram criteriosamente escolhidos, muito menos os seus vestidos preto ou vermelho que foi selecionado justamente para combinar com o salto de seus sapatos.
       E a gargantilha de pérolas que foi presente de um grande amigo de infância que no fundo a deseja em sua cama há muito tempo, ou um presente do marido, que inconscientemente o adotou como um pai, que a quer bem bonita para exibi-la aos colegas de trabalho, talvez algum amante bem sucedido, não descartando a hipótese também de ser uma jóia de família, do tipo da bisavó que passou para a avó que posteriormente foi para a mãe e finalmente para a filha que será mãe de alguém e que provavelmente este “objeto” permanecerá por mais uma geração.
       Tanta preocupação de se salvarem intactamente, sem nenhum arranhão, que naquele momento não se dava o menor valor para esses detalhes tão importantes que fazem as mulheres se sentirem realmente mulheres e para que os homens quando as olharem, sentirem desejos de lhes beijarem, tocarem, arrancar-lhes os tais detalhes, estupidamente para a exibição do nu estético e moral, para então enfiar-lhes a sua masculinidade viril, sem se preocuparem com a tal da sensibilidade, porque “homem sensível é veado”. Não generalizando, ainda há aqueles que preferem o fazer amor ao invés de fazer sexo, e distingue o aroma do corpo e a essência da alma.
       Os rapazes e homens já feitos na vida naturalmente, pareciam atletas, saltavam, driblavam os objetos e lixos que lhes apareciam no meio da rua, corriam com muita velocidade e tirando suas blusas de lã e seus paletós, arrancavam-lhes a maior e mais importante simbologia fálica de seus pescoços e a jogavam no chão, pode-se entender que, naquele momento toda a sua masculinidade viril não tinha importância alguma, pois não iria ser percebida por absolutamente ninguém, então sua coragem e brutalidade de ser “Homem” vai ao chão, sem nenhum drama ou vergonha. Outros tiravam a camisa, e seus músculos comprados na academia para impressionar as mulheres, ficaram expostos, quanto mais corriam, mais suavam e as gotículas extraídas de seus próprios corpos escorriam sobre seus peitos malhados e sensuais. Os pêlos de suas barrigas já umedecidos pelo esforço tão grande de se locomoverem. Os topetes estavam agora desfeitos e seus cabelos molhados, era notável a cor vermelha em seus peitos molhados, isso mesmo, o vermelho, a cor do poder por ser mais forte, a cor da pressa, a cor da sensualidade, a cor quente,do sexo, a cor do fast food, a cor que participa da escala RGB na composição das cores, a cor primária, a cor da guerra, entre outras coisas, a cor da delicada mulher, do ciclo feminino.
       Nos olhos desesperados, gritavam a mãe, a Super Mãe para lhes salvar, tirar-lhes dali, e se enfiarem por de baixo das saias da mamãe, num eterno globo de luz.
       Enquanto toda essa euforia se sucedia à minha frente, eu por minha vez ficava ali, intacta, incomunicável, e meu coração fraco e gélido não conseguia se sensibilizar com a tal situação. Eles gritavam, suplicavam por ajuda, outros já nervosos e revoltados,xingavam e destruíam tudo ao seu redor.
       O dia estava nublado e logo em seguida começou a chover, uma forte chuva já se derramava, mas eu não conseguia sentir a chuva sobre meu corpo mórbido e anestesiado não sei de quê. Meu cérebro não correspondia a situação conflitante do meu externo e tudo estava tão devagar, silencioso, não ouvia as pessoas nitidamente, não estava com medo, não sentia isso, não sentia nada. Pois a única coisa que eu sentia era de estar envolvida por um eterno globo de luz, branco e pacífico, como se eu estivesse debaixo da saia da mamãe.

2 comentários:

Luís Roberval Sales disse...

Aline os textos " A fuga e o Escondedouro" estão bem escritos.Fiquei em dúvida. No sonho/pesadelo Quem são esses homens desgovernados com olhos grandes e esbugalhados que estão vindo até Julietta Damasceno e onde estão ou seja onde (local) que se passa o sonho e porque começam a entrar em pânico chegando a querer ficar embaixo do glob de luz
(saia) da mamãe? Pode me dizer? Bjs Roberval

Aline Gaia disse...

Então, é tudo mensagem subliminar...se vc ver o texto da "Insônia", do medo que ela tem das pessoas e tal e o fato de ela ñ se relacionar muito c/ as pessoas, é devido as observações e pontos de vista que ela tem da própria sociedade, pessoas em geral, e ela ñ se exclui disso. Ela simplesmente está ali, como uma mera espectadora de tudo o que ela mesmo criara em sua mente. É complexo mesmo explicar, cada um tem uma interpretação do texto. Mas independentemente da interpretação, todo mundo grita "mãe socorro" qdo se está em perigo ou se sentindo ameaçado. Não importa onde esteja a mãe no argumento descritivo ou não, ela é o simbolo e/ou um arquétipo de proteção e de cuidado.
Obrigada pela observação Roberval. E ñ sei se me fiz entender...rs.